A Disney anunciou em 25 de junho de 2020 a alteração do tema da atração Splash Mountain na Disneyland de Anaheim (Califórnia) e no Walt Disney World (Flórida). Levando em conta a polêmica e as justificativas para a troca, a atração evoca diversos simbolismos da história Disney.

As cenas animadas do filme “A Canção do Sul” (1946) são consideradas até hoje grandes exemplos de carisma e de técnica por parte dos animadores da Disney.

As músicas se tornaram hinos informais dos parques temáticos e até mesmo de programas de TV como “The Wonderful World of Disney” (“Disneylândia” para os brasileiros). O novo tema, por outro lado, apresenta um elemento novo aos parques.

Canção do Sul (Song of the South) – O filme que a Disney “deu sumiço”.

“A Princesa e o Sapo” representa a inclusão da primeira princesa negra no rol de atrações e também traz um desafio da Disney em promover a primeira reformulação geral de uma grande atração, apenas comparável as também clássicas Haunted Mansion e Pirates of the Caribbean. Seguem abaixo 10 curiosidades sobre a Splash Mountain:

1- Clássico dos parques Disney

A “Splash Mountain” é uma das mais queridas e populares atrações dos parques Disney. Sua criação é repleta de curiosidades e é fruto de várias carências na Disney na década de 1980. A Disneyland (de Anaheim, na Califórnia) precisava de uma atração mais emocionante para atrair um público adolescente.

Uma das soluções foi criar um projeto de atração aquática com o famoso “splash” final.

A primeira inspiração dos Imagineers para o que viria a ser a Splash Mountain está no parque vizinho e concorrente da Disneyland na Califórnia, chamado Knott’s Berry Farm.

A atração Timber Mountain Log Ride tinha a emoção que a Disney queria injetar em seus parques.

A Splash Mountain foi inaugurada em 1989 na Disneyland e em 1992 no Magic Kingdom no Walt Disney World.

A atração Splash Mountain em sua versão atual na Frontierland do parque Disney’s Magic Kingdom

2- A escolha do projeto foi fruto do acaso

Nos anos 1980 a Disney procurou investir em novas atrações que atraíssem um público mais adolescente.

Na época a Disney aprovou 3 projetos a toque de caixa, cada qual com um propósito:

  1. “Videopolis” foi uma danceteria (sim, já existiu uma dentro da Disneyland) para atrair o público da MTV,
  2. “Captain EO” foi um filme 3D estrelado pelo artista pop mais famoso do momento (Michael Jackson) e
  3. “Star Tours”, o simulador baseado na trilogia espacial mais popular da época – “Star Wars”.

Na segunda rodada para escolher projetos, o então CEO da Disney, Michael Eisner, fez uma ronda pela Walt Disney Imagineering para inspecionar os projetos. Levou consigo o filho adolescente, que ficou admirado com uma maquete de uma montanha com barcos descendo uma longa rampa na água e avisou o pai que era isso que faltava na Disneyland.

Tratava-se da maquete da Zip-a-Dee River Run, projeto do Imagineer Tony Baxter, o mesmo responsável pela montanha-russa Big Thunder Mountain. O projeto teria seu nome mudado para Splash Mountain.

3- Controlando os custos

A Splash Mountain segue o padrão ambicioso de grandes atrações clássicas como Haunted Mansion e Pirates of the Caribbean, porém em meados dos anos 1980 a Disney não era o colosso que é 40 anos depois.

Os executivos gostaram da ideia mas não estavam dispostos a gastar tanto. A solução foi encontrada pelo Imagineer Tony Baxter. Na Tomorrowland da Disneyland havia uma atração chamada “America Sings”, que ocupava o teatro antes ocupado pelo “Carrossel do Progresso” (hoje no Magic Kingdom).

A atração contava a história da evolução musical americana usando animatrônicos de animais caracterizados. Baxter era fã dos personagens criados para essa atração pelo velho mestre Marc Davis (conhecido animador de personagens como Malévola e Cruela Cruel). Vendeu a ideia que a Disney cortaria os custos se aproveitasse todos aqueles animatrônicos.

Todos eram animais e seriam aproveitados como novos personagens. Na prática a economia foi reduzida pois a Disney teve um alto custo com o projeto e ainda precisou investir nos animatrônicos do coelho Quincas (Compadre Coelho), Zé Grandão (o urso) e João Honesto (a raposa).

A Splash Mountain custou mais de US$ 75 milhões se tornando a atração mais cara do parque até 1989.

4- Tema polêmico

Na época de sua criação a Disney não tinha um grande portfólio de sucessos. Lembremos que isso foi antes de A Pequena Sereia, A Bela e a Fera ou O Rei Leão.

O maior sucesso até então era o filme live-action “Splash: Uma Sereia em Minha Vida” e o então CEO Michael Eisner chegou a sugerir o tema desse filme para ajudar no marketing (no que foi literalmente ignorado). A saída para encontrar um tema foi olhar para o passado. Tony Baxter e outros Imagineers lembraram de “A Canção do Sul”, filme de 1946 contando as histórias do universo fantasioso de Tio Remus, o contador de histórias criado pelo folclorista Joel Chandler Harris, retratado como um ex-escravo que leva uma vida simples e feliz com relativa liberdade.

Arte conceitual criada pela Disney para passar uma ideia de como a atração ficará depois da retematização

Porém, o filme é ambientado no período da reconstrução dos Estados Unidos, entre 1865 e 1877, e o personagem se comporta com certo saudosismo e o filme retrata certas representações estereotipadas da cultura afro-americana que a partir dos anos 1960 passaram a ser criticadas.

Não era bem o filme em si que atraiu os Imagineers e sim as belíssimas cenas de animação, consideradas até hoje algumas das mais primorosas da história da Disney. Porém, o filme é fruto de sua época.

A exemplo de “E o Vento Levou…”, a história do Tio Remus possui conotações racistas e consideradas ofensivas por parte do público. Tanto que o filme foi lançado em VHS e exibido na televisão na Europa e na América do Sul, porém não nos Estados Unidos.

Desde a década de 1960 a Disney se tornou atenta aos movimentos dos direitos civis e acabou banindo o filme.

Esta ação é discutível tendo em vista que é melhor advertir e ensinar do que proibir, mas na hora de criar a Splash Mountain os Imagineers tiveram o cuidado de eliminar qualquer referência ofensiva e omitiu o personagem do Tio Remus.

Em seu lugar, um sapo faz a narração inicial no começo da aventura. Por isso não é correto afirmar que a atração tem cenas racistas.

5- Versões diferentes

A Splash Mountain é uma “flume ride”, mas a atração também é conhecida pela descrição de montanha-russa aquática. Ela não possui apenas a grande queda de 16 metros em sua parte frontal. A aventura tem algumas quedas.

A versão da Disneyland possui 3 quedas, a da Tokyo Disneyland possui 4 quedas, e a do Magic Kingdom possui 5 quedas. Os visitantes sentam num barco em forma de tronco. A configuração original desses barcos na Disneyland era de 5 pessoas em fila (sentados um atrás do outro) com barras laterais. Hoje a configuração atualizada aceita até sete pessoas).

Prevendo a demanda maior no Magic Kingdom, os Imagineers aumentaram o tamanho da calha d’água e os barcos foram feitos para a configuração de 8 pessoas (quatro fileiras de bancos com duas pessoas cada, com barras frontais). Na Tokyo Disneyland, a Splash Mountain possui as cenas invertidas – todo o desenho do projeto foi invertido respeitando o local diferente onde a atração foi instalada.

6- Surpresa na foto

A Splash Mountain possui a tecnologia de captura de foto durante o trajeto. Quando o barco está descendo sua maior queda o flash avisa que sua foto foi registrada. O que poucos sabem é que esta atração é conhecida pelas mais divertidas e inusitadas fotos de reações. E muitos grupos aproveitam para preparar antecipadamente o que farão.

Grupos de estudantes, amigos e famílias fazem gestos, mostram recados, simulam desmaios ou fazem caretas.

Procurando na internet é possível encontrar diversas dessas fotos.

7- Hinos informais da Disney

Você pode até não identificar, mas certamente já ouviu alguma música do filme ou da Splash Mountain andando pelos parques Disney ou assistindo um dos diversos especiais de TV ao longo de décadas.

São as clássicas:

  • “How Do You Do?”,
  • “Ev’rybody Has a Laughing Place” e
  • “Zip-A-Dee-Doo-Dah”,

Esta última um hino informal dos parques Disney ao lado de “When You Wish Upon a Star” da animação Pinóquio (1940). A versão ouvida na Splash Mountain é uma gravação com um coral de 75 cast-members feita em 1987. O loop musical dura mais de 25 minutos e cada animatrônico precisou de 80 horas para ser sincronizado.

8- Novo tema

A Disney sabe que a Splash Mountain tematicamente é um problema. Ao longo dos anos e com a produção de muitas animações de sucesso, novos temas foram explorados pelos Imagineers.

“Pocahontas” foi especulado e por algum tempo até mesmo “A Nova Onda do Imperador” teve um projeto imaginado.  O problema aqui é como um cenário inca se encaixaria na Critter Country na Disneyland ou na Frontierland no Magic Kingdom. Um tema mais sensato surgiu mais recentemente com a animação “A Princesa e o Sapo”, o primeiro filme a trazer uma princesa negra no cânone de filmes Disney.

O tema não só traria a diversidade e representatividade esperada na Disney, mas revigoraria uma área do parque com menor potencial de merchandising. Do ponto de vista da tematização externa há desafios.

New Orleans não tem montanhas (o que seria um pouco estranho na tematização da New Orleans Square na Disneyland), e uma montanha arborizada seria estranha ao lado da Big Thunder Mountain em cenário de faroeste. Por isso talvez a maior alteração seja externa com a instalação de uma enorme árvore no topo da atração.

Isso se a Disney respeitar o conceito artístico divulgado para a imprensa.

9 – Timing

O anúncio do novo tema da Splash Mountain não é puramente espontâneo. Embora a Disney afirme em release que já está pensando na alteração temática desde 2019, a verdade é que o timing a obrigou a tirar o projeto do bolso do colete.

Isso é reforçado pelo fato de que outros projetos anunciados anteriormente para os parques foram adiados. Os parques Disney foram seriamente afetados pela pandemia da Covid-19.

Seus funcionários têm aparecido nas redes de notícias questionando os protocolos de segurança e os estados da Flórida e Califórnia se destacam com a ampliação no número de casos positivos de Covid19. 

A Disney também busca ampliar seus ganhos nos próximos anos. “A Princesa e o Sapo” tem um potencial lucrativo muito maior que “A Canção do Sul”, filme virtualmente desconhecido do grande público, apesar da polêmica. E talvez o mais importante, hashtags e petições sozinhas não pressionam a Disney.

A empresa observa quais os potenciais que possui para ganhar ou perder com uma mudança. No caso do tema de “A Princesa e o Sapo”, ela soma “agenda positiva” (inclusão de uma princesa negra) + “potencial financeiro” (vender mais produtos) + “desviar pauta negativa” (funcionários na empresa reclamando da reabertura precipitada dos parques na imprensa). Vale lembrar que apostar na “agenda positiva” nem sempre é sinônimo de progresso no geral.

Recentemente a pressão das mídias sociais fez a Disney retirar a série “Love, Victor” do Disney+ certamente devido a temática gay.

10 – Disney não é museu

Walt Disney nunca imaginou a Disneyland como sendo um museu. Embora fosse um conservador da “velha América”, ele investia constantemente em novidades e apostava no progresso. Muitas das atrações clássicas permanecem nos parques.

Mas nem de longe a polêmica da mudança de tema na Splash Mountain é nova.

Desde a década de 1980 os fãs discutem calorosamente por qualquer mudança mais abrangente. Em 1982, muitos anos antes da internet, muitos fãs se preocuparam ao verem quase toda a Fantasyland da Disneyland demolida para a criação de uma área toda renovada com novas fachadas e atrações atualizadas. 

Em 1998 os fãs discutiram nas listas de discussão e nos Yahoo!Groups (os fóruns populares naquela época) quando a Disney anunciou que substituiria a dark ride “Mr. Toad Wild Ride” (inspirada numa animação de 1949) por “The Many Adventures of Winnie the Pooh”. Na época a troca foi vista como oportunismo pois o ursinho Pooh era o personagem mais lucrativo da Disney.

A pressão chegou na imprensa e até nas emissoras de TV em Orlando. O Sr. Sapo não sobreviveu, mas a Disney acabou não mexendo na versão da atração na Disneyland de Anaheim (está aberta até hoje). 

Em 1999 os fãs novamente brigaram quando a Disney anunciou que demoliria o pavilhão Horizons no Epcot. O debate consistia se a “Mission: Space” deveria ou não substituir um pavilhão tão querido, porém datado. Sem patrocínio, a Disney novamente buscou equilibrar custo e benefício e apostou mesmo na substituição. Pena que o atual pavilhão não seja tão querido. 

E como não esquecer o chapéu do Mickey no centro do parque Hollywood Studios? A estrutura sempre foi planejada como algo temporário para celebrar o centenário de Walt Disney em 2001.

Os altos custos da demolição foram adiando os planos e o chapéu do Mickey feiticeiro acabou se tornando um símbolo para a nova geração de visitantes. Fãs tradicionalistas, por outro lado, sempre defenderam sua retirada e eram barulhentos nos fóruns de discussão nesta questão.

Considerações Finais

Como você viu, a polêmica da Splash Mountain não foi a primeira e certamente não será a última.

Em toda mudança veremos polêmicas se formando, de um lado os apoiadores da visão de que “A Disneyland nunca estará finalizada”, ou seja, as mudanças fazem parte da evolução dos parques temáticos.

Do outro lado os “puristas”, que defendem que os temas e atrações devem permanecer o mais fiéis ao formato original quanto possível.

Qual a sua opinião? Escreva nos comentários abaixo!

  • Você apoia as mudanças (desde que venha para melhorar)?
  • Ou você prefere que tudo permaneça em sua forma mais intocada possível?